quinta-feira, outubro 09, 2008

Procuro-me


Sem mais nenhum critério
Busco sentir conforto qualquer
Desvendando o seu mistério
Nesse corpo que me quer.

Sem nenhuma vaidade
Percorro todos os seus cantos
Nessa enorme variedade
De segredos.

Com tamanha ansiedade
Beijo a boca sua
Como jovem de pequena idade
Deflora uma flor nua
À procura de si mesmo।


Marighetti

Canção

Pus o meu sonho num navio
e o navio em cima do mar;
- depois, abri o mar com as mãos,
para o meu sonho naufragar

Minhas mãos ainda estão molhadas
do azul das ondas entreabertas,
e a cor que escorre de meus dedos
colore as areias desertas.

O vento vem vindo de longe,
a noite se curva de frio;
debaixo da água vai morrendo
meu sonho, dentro de um navio...

Chorarei quanto for preciso,
para fazer com que o mar cresça,
e o meu navio chegue ao fundo
e o meu sonho desapareça.

Depois, tudo estará perfeito;
praia lisa, águas ordenadas,
meus olhos secos como pedras
e as minhas duas mãos quebradas

Cecília Meireles

quarta-feira, outubro 08, 2008

O enterrado vivo

É sempre no passado aquele orgasmo,
é sempre no presente aquele duplo,
é sempre no futuro aquele pânico.

É sempre no meu peito aquela garra.
É sempre no meu tédio aquele aceno.
É sempre no meu sono aquela guerra.

É sempre no meu trato o amplo distrato.
Sempre na minha firma a antiga fúria.
Sempre no mesmo engano outro retrato.

É sempre nos meus pulos o limite.
É sempre nos meus lábios a estampilha.
É sempre no meu não aquele trauma.

Sempre no meu amor a noite rompe.
Sempre dentro de mim meu inimigo.
E sempre no meu sempre a mesma ausência।


Drummond

terça-feira, outubro 07, 2008


Por detrás da alma sua
Vejo uma flor inteira
E que de beleza nua
Inunda-me de sentido.

Quem dera


Quem dera você ouvisse
Não minha boca, mera convenção,
Mas minha alma de sentidos
Que fala do alto dessa sensação
De uma derrota definitiva e mortal

Quem dera você olhasse
Não meu contorno, nem silhueta.
Pois isso é mostra para o mundo
Cheio de fantasias vãs e padrões corporais
Pobres em espírito e vazios de sentido.
Mas que você olhasse para o que sou
O que me fez a caminhada longa
O que me tornaram as tantas lágrimas sentidas.

Olhe em meus olhos
E não veja um homem, tão pouco assim.
Veja uma história que se renova a cada dia viva
Que corre pelas veias
E que é o próprio sentido da palavra verdade.

Saiba sou eu a vida
Vida vivida, respirada, degustada, adormecida e amanhecida
Que insistiu em não ver।


Marighetti